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A Tecnologia e a Reinvenção na Academia


Wille Muriel - Diretor Executivo da Carta Consulta


Na gestão universitária, nada pode ser mais subversivo do que uma ação da tecnologia, eu suponho. E venho dizendo isso já há muitos anos em vários encontros com amigos que trabalham na gestão das universidades aqui no Brasil. Ao longo dos anos, esta capacidade de subverter a ordem estabelecida vem sendo aprimorada e ficamos cada dia mais competentes para mudar praticamente tudo por meio da tecnologia.

 

Por outro lado, temos a força da cultura universitária que estabelece limites e tem sido refratária àquilo que não lhe parece relevante sob o aspecto científico. É o papel da universidade, ou seja, buscar a certeza e relevância socioeconômica e científica pelo método, promovendo a pesquisa e a extensão.

 

Só que a conta não fecha como antes para as universidades que não conseguem mais se estabelecer sobre o tempo das pessoas. Não dá para cobrar das pessoas aquilo que elas não têm mais: tempo. Segundo o site Olhar Digital, o jovem brasileiro da faixa etária entre 17 e 25 anos passa, em média, 3 horas e 30 minutos por dia conectado em redes sociais. Só no Instagram, eles cumprem uma média de 1 hora e 32 minutos por dia. Fico a imaginar o desempenho acadêmico que teríamos se este tempo fosse diariamente empenhado em estudos de conteúdos científicos, projetos de extensão e pesquisa. Imagino o impacto positivo dessas pessoas na sociedade e no mundo do trabalho. Será que o entretenimento tomou conta do tempo das pessoas na medida em que elas percebem que isso gera mais valor do que uma experiência na universidade? Ou será que elas percebem a diferença, mas perderam a capacidade de controlar o próprio tempo no dia a dia? E, no caso brasileiro, além do tempo nas redes sociais, os jovens também precisam trabalhar para cumprir cargas horárias de estágio ou para gerar renda e financiar os estudos, e isso representa mais um concorrente do tempo para a universidade.

 

A universidade precisa repensar o seu lugar num ecossistema midiático complexo em que tudo concorre pelo tempo dos alunos (e dos professores), pois a tecnologia abriu uma porta para aquilo que eles mais gostam de fazer: conhecer pessoas novas, conversar, divertir, estabelecer associações e relacionamentos interessantes. Quando são jovens, não percebem com clareza a importância do tempo e nem a sua velocidade, e valorizam mais os conteúdos bem envelopados das redes sociais do que o design ultrapassado das universidades. A tecnologia subverteu o comportamento das pessoas na universidade quando se estabeleceu num vazio midiático já antes indicado pelos próprios acadêmicos. O conteúdo (raso e não raso) disponível e organizado pela tecnologia vem recoberto de elementos engajadores, estrategicamente estruturados por processos que se aprimoram no tempo. E a gestão da universidade tentando entender tudo isso, reduzindo custos operacionais para competir com outras universidades e agora até com os cursos livres da web, investindo milhões em divulgações para captar alunos ou, no plano acadêmico, montando call centers para dar tutoria acadêmica em até 24 horas para seus alunos da EaD.

 

A gestão da universidade busca soluções velhas para resolver questões do presente e do futuro. Mentalidades ultrapassadas transformaram sua oferta em um grande mercado de commodity, e agora tudo parece desvalorizado – as margens de contribuição por curso em portfólios extensos indicam quem sustenta a graduação nas universidades: Medicina? Medicina Veterinária? Direito? Pouquíssimos cursos ainda são viáveis.

 

A universidade precisa compreender que a mesma tecnologia que subverteu o comportamento dos acadêmicos também pode substituir mentalidades envelhecidas por propostas mais ousadas e que graças à tecnologia, isso não significa correr riscos maiores dos que a universidade já está correndo – o risco de não mudar é imenso. Contudo, e considerando todas as possibilidades tecnológicas do presente, não é difícil perceber que mudar nunca foi tão viável.

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